A Jornada do Último Guerreiro Capítulo 27
Dividido Entre Dois Mundos
O céu sobre a vila Liang permanecia opaco, como se refletisse o peso que recaía sobre os ombros de Tao. Desde o momento em que a carta de Lorde Feng chegara, cada segundo parecia mais carregado. As ruas da vila, geralmente movimentadas, estavam desertas; as pessoas permaneciam em suas casas, com medo do que estava por vir. No centro de tudo, Tao carregava um fardo que parecia crescer a cada instante.
Dentro de casa, a atmosfera também era tensa. Mei, sua mãe, ocupava-se em silêncio na cozinha, movendo as mãos mecanicamente enquanto preparava uma refeição que ninguém tinha vontade de comer. Cheng, sentado à mesa, olhava fixamente para o canto da sala, pensativo. Tao estava encostado na parede, segurando a Pérola Celestial dentro de sua bolsa, como se o simples contato pudesse lhe dar clareza sobre o que fazer.
— Está tudo bem, filho? — perguntou Cheng, sua voz calma mas carregada de preocupação.
Tao desviou o olhar para o pai, incapaz de esconder o tumulto que se passava em sua
mente.
— Não — respondeu ele, a honestidade saindo sem que ele pudesse evitar. — Não está tudo bem.
Cheng inclinou-se para frente, apoiando os braços sobre a mesa. Seus olhos, embora envelhecidos, mantinham a firmeza de um homem que já enfrentara muitas dificuldades.
— Quer conversar sobre isso? — perguntou, sabendo que o filho precisava falar, mesmo que fosse difícil.
Tao suspirou profundamente, puxando uma cadeira para se sentar ao lado do pai. Ele olhou para as mãos, como se as respostas estivessem gravadas nelas.
— Eu me sinto... preso. Não sei o que fazer. — Ele pausou, apertando a bolsa onde guardava a Pérola. — Parte de mim quer fugir. Proteger vocês, levar a Pérola para longe e acabar com essa ameaça antes que ela destrua tudo. Mas outra parte... sabe que eu não posso abandonar a vila.
Cheng assentiu, esperando pacientemente que Tao continuasse.
— Se eu entregar a Pérola, Feng terá o poder que deseja. Mas se eu não fizer isso, ele virá com seu exército, e a vila será destruída. — Tao ergueu os olhos para o pai, sua voz tremendo. — Como posso escolher?
Cheng o observou por um momento, o peso das palavras do filho visível em seu rosto.
Ele respirou fundo antes de falar.
— Tao, eu não posso dizer qual é a decisão certa. Mas posso dizer isto: às vezes, não existem escolhas fáceis. Não podemos controlar o que outros fazem, mas podemos controlar como respondemos.
— E se a resposta for errada? — Tao perguntou, sua voz quase um sussurro. Cheng sorriu levemente, estendendo a mão para o ombro do filho.
— Então aprendemos, nos levantamos e tentamos de novo. A vida é assim. Mas eu acredito em você, meu filho. Seja qual for sua escolha, sei que você fará o melhor que puder.
As palavras de Cheng trouxeram um breve alívio ao coração de Wang, mas a dúvida ainda o corroía.
Ele olhou para Mei, que permanecia em silêncio, mas claramente ouvia cada palavra.
— Mãe, você não vai dizer nada? — perguntou Tao, com um toque de desespero na voz.
Mei virou-se para ele, limpando as mãos no avental. Seus olhos estavam cheios de emoção, mas sua voz era serena.
— Não preciso dizer nada, Tao. Você já sabe o que precisa fazer. Só quero que você saiba que estamos com você, independentemente da sua decisão.
As palavras de Mei atingiram Tao com força. Ele sabia que sua família o apoiaria, mas isso não tornava sua escolha mais fácil. Ele sentia o peso da Pérola como se fosse uma pedra amarrada ao seu espírito, puxando-o para direções opostas.
Depois de alguns minutos de silêncio, Tao levantou-se abruptamente.
— Preciso de ar — disse ele, saindo antes que alguém pudesse responder.
Lá fora, o vento era frio e cortante, mas Tao mal sentia. Ele caminhou em direção às barricadas na entrada da vila, onde alguns guardas locais ainda estavam reforçando as defesas. Eles o cumprimentaram com acenos curtos, mas ele estava perdido em seus pensamentos.
Ele olhou para a floresta além das barricadas, sentindo um arrepio na espinha. A sensação de estar sendo observado não o abandonava. Ele sabia que Feng estava em algum lugar lá fora, esperando, planejando.
“Você sente isso, não sente?” A voz da entidade ecoou em sua mente, baixa e sombria. Tao apertou os olhos, tentando bloquear a presença, mas ela persistiu.
— O que você quer de mim? — murmurou, baixo o suficiente para que ninguém ao redor pudesse ouvir.
“Eu quero que você veja. Que compreenda. A Pérola que você carrega é mais do que um simples artefato. É a chave para algo muito maior. Algo que Feng nunca deve possuir.”
— E se eu não puder impedi-lo? — Tao perguntou, sua voz carregada de dúvida. “Então você terá que estar preparado para sacrificar tudo.”
As palavras da entidade pairaram no ar como uma sombra, e Tao sentiu o peso delas em seu coração. Ele sabia que estava sendo guiado por algo antigo e poderoso, mas isso não tornava sua tarefa mais clara ou menos assustadora.
Quando a noite caiu, Tao voltou para casa, onde Cheng o aguardava na sala. Mei havia ido dormir, mas Cheng parecia determinado a falar com o filho mais uma vez.
— Sente-se, Wang — disse ele, apontando para a cadeira ao lado.
Tao obedeceu, exausto tanto física quanto emocionalmente. Cheng olhou para ele por um longo momento antes de falar.
— Lembra-se de quando você era pequeno e caía tentando escalar aquela árvore no quintal? — perguntou Cheng, com um sorriso nostálgico.
Tao franziu a testa, confuso com a mudança de assunto.
— Sim... eu nunca conseguia subir muito alto.
— Mas nunca desistiu — Cheng continuou. — Mesmo quando se machucava, você se levantava e tentava de novo. Você tinha uma determinação que sempre admirei.
Wang balançou a cabeça.
— Não é a mesma coisa, pai. Isso... isso é diferente.
Cheng colocou a mão sobre o ombro do filho, o olhar sério.
— Não, não é diferente. O princípio é o mesmo. Não importa o quão difícil ou impossível algo pareça, você não pode deixar o medo pará-lo. Você é mais forte do que pensa, Tao. E eu sei que, seja qual for sua decisão, você fará o que for certo.
As palavras de Cheng ressoaram profundamente em Tao. Ele não sabia se estava pronto para enfrentar Feng, mas sabia que não podia deixar sua vila, sua família, seus amigos, à mercê de um homem tão cruel.
Quando finalmente se retirou para o quarto, segurando a Pérola Celestial nas mãos, ele sentiu uma onda de calma passar por ele. Pela primeira vez, a dúvida começou a diminuir, substituída por uma determinação silenciosa.
Ele sabia que não podia falhar. E, mesmo que não tivesse todas as respostas, estava pronto para lutar pelo que amava.
Na escuridão de seu quarto, a voz da entidade ecoou uma última vez antes de ele dormir.
“Escolha bem, Tao. A batalha está apenas começando.”
E com isso, Tao fechou os olhos, pronto para o que o futuro lhe reservava.
Indíce
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