A Jornada do Último Guerreiro Capítulo 19

A floresta ao redor da vila Liang parecia ainda mais escura à medida que a noite avançava. Apenas o suave farfalhar das folhas e o canto ocasional de uma coruja quebravam o silêncio, mas a escuridão escondia mais do que simples vida selvagem. Movendo-se como uma sombra, uma figura encapuzada deslizava entre as árvores, os passos tão silenciosos quanto o vento. Seus olhos, brilhando com uma luz fria sobre o capuz, estudavam o terreno à sua frente, cada detalhe do ambiente sendo gravado em sua mente.

Desde que havia chegado àquela região, o enviado de Lorde Feng sabia que sua missão era muito mais do que apenas vigiar Tao e Shen. Sua verdadeira tarefa estava nas profundezas das montanhas ao norte, onde o lendário artefato conhecido como Pérola Celestial estava escondido há séculos, protegido por magias antigas e guardiões de eras esquecidas. Aquele objeto era crucial para os planos de Lorde Feng, e o espião sentia o peso dessa responsabilidade com cada passo que dava.

Com passos leves e cuidadosos, ele subiu uma trilha íngreme, o ar ao redor carregado com uma energia densa, quase sufocante. A cada metro que avançava, a vegetação ao seu redor diminuía, dando lugar a grandes rochas desgastadas pelo tempo, marcadas com símbolos ancestrais que poucos ainda compreendiam. Para o observador comum, aquele lugar pareceria apenas mais uma parte das montanhas, mas a figura encapuzada sabia que havia algo mais. Sentia isso nas vibrações da terra sobre seus pés e no peso invisível que permeava o ar.

Ele parou em frente a uma imponente formação rochosa. As inscrições que cobriam a pedra eram antigas, desgastadas pelo tempo, mas ainda emanavam uma aura de poder. Aproximando-se, o espião ajoelhou-se diante da pedra, seus dedos enluvados tocando os símbolos com cuidado. Ele murmurou para si mesmo, quase num sussurro, enquanto seus olhos brilhavam com uma excitação mal contida.

—    Aqui... — sua voz, baixa e controlada, foi abafada pelo vento suave que passava pela montanha.

— A Pérola está escondida aqui. A magia que a protege é antiga, mas não será o suficiente para me deter.

De dentro de suas vestes, ele retirou um pequeno artefato, uma pedra negra que pulsava com uma energia sinistra. A luz da lua parecia evitar aquela pedra, como se sua presença fosse um erro na própria ordem natural. Segurando-a acima dos símbolos na rocha, o enviado de Lorde Feng murmurou palavras numa língua esquecida, uma língua que carregava em si o poder das trevas. Imediatamente, as inscrições na pedra brilharam, suas formas antigas revelando um padrão oculto até então invisível.

—    A entrada... — ele murmurou, um sorriso fino surgindo em seus lábios enquanto observava o resultado de seu feitiço.

A rocha à sua frente começou a tremer levemente, e por um momento, uma abertura quase imperceptível se formou, revelando o caminho para a câmara onde a Pérola Celestial estava escondida. No entanto, ele sabia que não poderia avançar agora. A magia que protegia aquele lugar era poderosa demais para ser desfeita tão rapidamente. Além disso, ele havia sido alertado sobre os guardiões que protegiam o artefato – criaturas antigas e letais, que não podiam ser subestimadas.

Ele se levantou devagar, guardando o artefato de volta em suas vestes e recuando para a escuridão da floresta. **Ainda não era o momento.** Primeiro, ele precisaria de mais informações, mais poder, e talvez até de reforços. Seus olhos brilharam com malícia enquanto ele se conectava mentalmente com seu mestre, Lorde Feng.

Fechando os olhos, ele concentrou sua mente, sentindo sua consciência se estender além do plano físico. Era como atravessar um nevoeiro denso, mas ele estava acostumado com esse tipo de comunicação. As palavras de sua mensagem ecoaram em sua mente, como se fossem pronunciadas por uma voz que ele mal reconhecia como sua.

“Lorde Feng, eu encontrei a localização da Pérola Celestial. Está escondida nas profundezas das montanhas ao norte da vila Liang. Contudo, as proteções ao redor são formidáveis. Há guardiões, e eu precisarei de instruções para seguir adiante.”

Houve um momento de silêncio, um espaço entre pensamentos que parecia se estender por uma eternidade. Então, a resposta veio como uma presença poderosa, esmagadora, que encheu a mente do espião com a força de uma tempestade. A voz fria de Lorde Feng, ressoou com uma autoridade incontestável.

“Excelente trabalho. Mas não cometa erros agora. Essa missão é delicada. Aguarde reforços. O poder da Pérola Celestial é grande demais para ser tratado com leviandade, e os guardiões que a protegem não são oponentes comuns. Não se precipite. Logo, darei mais instruções. E…” a voz de Feng se aprofundou, assumindo um tom mais sombrio “não permita que sua presença seja descoberta. A situação com o jovem Tao está em desenvolvimento. Ele pode ser uma peça crucial no nosso jogo.

O espião abriu os olhos lentamente, sentindo a presença de seu mestre desaparecer gradualmente de sua mente. O sorriso em seus lábios se alargou enquanto ele se virava para olhar a formação rochosa uma última vez antes de se afastar, desaparecendo nas sombras da floresta como uma serpente que se recolhe para sua toca.

—    Como desejar, meu senhor, — murmurou, mais para si mesmo do que para qualquer outra pessoa. “Aguardo suas ordens.”

***

Horas se passaram enquanto a figura misteriosa continuava sua exploração cuidadosa da área ao redor da montanha. Cada passo era meticulosamente planejado, cada observação anotada mentalmente. Ele traçou um mapa detalhado da região, marcando os pontos onde a energia mágica era mais intensa e as áreas onde possíveis guardiões poderiam estar ocultos. Sabia que o tempo estava contra ele. Com os saqueadores se aproximando das aldeias vizinhas e a tensão crescendo entre os aldeões, ele precisava agir antes que a atenção indesejada recaísse sobre a vila Liang e as montanhas ao norte.

Enquanto analisava seu mapa improvisado, a mente do espião vagou para os acontecimentos recentes. Ele estava ciente do crescente poder de Tao, do vínculo que o jovem compartilhava com a entidade dentro de si. Sabia que Tao seria um obstáculo, mas também uma oportunidade. Se o garoto pudesse ser manipulado... ou, em último caso, eliminado, o caminho para a Pérola seria muito mais fácil.

“Ele ainda não faz ideia do poder que carrega,” pensou o espião. “Mas não subestimarei alguém como ele. Qualquer erro agora pode ser fatal.”

Ainda assim, não havia como negar a excitação que o enviado de Lorde Feng sentia. A Pérola Celestial estava ao seu alcance, e o poder que ela concederia a Feng, e por extensão, a ele – era incalculável. Logo, todos os obstáculos seriam removidos, e o artefato seria deles. As peças estavam se movendo no tabuleiro, e ele apenas precisava aguardar o momento certo para agir.

Enquanto as primeiras luzes da manhã começavam a despontar no horizonte, a figura encapuzada desapareceu nas sombras, uma presença invisível entre as árvores. O verdadeiro jogo estava prestes a começar.