
Superman: Força e Honra Prólogo
O Chamado Silencioso
Smallville, Kansas, abril de 2004. A primavera abraçava a fazenda dos Kents, com campos verdes se estendendo sob um céu claro, o milho jovem tremendo numa brisa morna que trazia o perfume de terra viva. O sol de fim de tarde pintava o horizonte de rosa e dourado, um calor suave que parecia prometer respostas. Clark Kent, 15 anos, estava ao lado do pai, Jonathan, consertando uma cerca na beira do pasto, as mãos firmes segurando um mourão de madeira. Ele parecia um garoto qualquer do Kansas — jeans gastos, camiseta cinza, cabelo bagunçado pelo vento —, mas seus olhos azuis carregavam uma pergunta que o céu não respondia.
— Mais firme, Clark. Não precisa ter pressa — disse Jonathan, o martelo batendo com ritmo na madeira. Ele era um homem de ombros largos, rosto marcado pelo sol, com um orgulho quieto no filho que não dizia em voz alta.
Clark assentiu, segurando o mourão com uma força que não precisava. Ele podia cravar a madeira com um dedo, mas ali, sob o olhar do pai, ele era só Clark. Só o filho dos Kents.
— Pai… você já sentiu que não pertence a um lugar? — perguntou, baixo, quase engolido pelo som do martelo.
Jonathan parou, o martelo suspenso, e olhou pro filho. Havia algo na voz de Clark, um peso que ele conhecia, mas não sabia como aliviar.
— Todo mundo sente isso às vezes, filho. Mas você é nosso. Sempre vai ser. — Ele voltou ao trabalho, mas a resposta não caiu tão leve quanto a brisa.
Clark terminou a cerca em silêncio, com o coração inquieto. Ele sabia que era diferente desde pequeno — quando ouviu o coração de uma vaca a dois campos de distância, ou quando levantou o trator aos 10 anos, achando que era normal. Jonathan e Martha sempre o abraçaram, mas nunca explicaram. E ele, com medo de machucá-los, parou de perguntar. Mas ali, na primavera, com o mundo florescendo, a pergunta queimava: Por que eu sou assim?
— Clark, vem jantar! — Martha gritou da varanda, o avental leve balançando na brisa. Sua voz era um farol, quente, puxando ele de volta. Clark sorriu, mas o sorriso não chegou aos olhos. Ele limpou as mãos no jeans e caminhou pro celeiro, precisando de espaço. O telhado era seu refúgio, onde o céu parecia mais perto, mesmo que não tivesse respostas
No caminho, parou num canto do pasto, onde ninguém via. Olhou pras mãos — grandes, calejadas, capazes de coisas que ele escondia. Num impulso, pegou um fardo de feno, pesado o suficiente para dois homens, e o ergueu com uma mão, o braço nem treme. O vento da primavera dançava ao redor, mas ele sentiu um vazio. Se eu sou assim, o que sou? Largou o fardo, o coração acelerado, e subiu pro celeiro, as botas ecoando na escada de madeira.
No telhado, sentou com as pernas penduradas, a faca do aniversário de 13 anos na mão, um presente de Jonathan. Ele não entalhava hoje — só olhava pro horizonte, o pôr do sol tingindo o milho jovem de dourado. A fazenda era tudo que ele conhecia: o silo brilhando, o mugido das vacas, o rádio na varanda tocando country baixo. Mas o céu, sempre o céu, parecia o chamar.
Lá embaixo, Martha saiu para a varanda, com o avental dobrado nas mãos, e parou ao lado de Jonathan, que terminava a cerca.
— Ele tá no telhado de novo — ela disse, a voz suave, mas com uma sombra de preocupação.
Jonathan largou o martelo, o olhar no celeiro, onde a silhueta de Clark se recortava contra o céu rosado.
— Ele tá perguntando mais, Martha. Não sei quanto tempo podemos esperar para contar a ele.
Martha apertou o avental, os olhos brilhando com o peso de um segredo que guardava há 15 anos — a nave, o cristal, a verdade sobre o menino que caiu do céu.
— Ele precisa ser nosso filho antes de ser… outra coisa — disse ela, baixo. — Mas ele tá sentindo, Jon. Alguma coisa tá chamando ele.
Clark não ouviu a conversa, perdido no próprio mundo. Fechou os olhos, deixando a primavera entrar: o farfalhar das folhas novas, o zumbido de abelhas, o canto de um pássaro a quilômetros. E então, algo novo. Um pulsar. Grave, profundo, como um coração batendo sob a terra, ou além das estrelas. Não era do Kansas. Não era da Terra. Ele abriu os olhos, o peito vibrava, o calor subindo pelos ossos. Era mais que som — era vivo, fragmentado, como uma voz tentando falar. Por um instante, ele viu algo: uma cidade de cristal, torres brilhando sob um céu vermelho, um eco de algo que parecia casa. E, no fundo, um sussurro frio, como se o vazio tivesse ouvido o mesmo chamado.
Clark levantou, o seu coração estava disparado, a testa molhada com suor. Ele não sabia o que era aquele pulsar — um cristal escondido na nave que os Kents guardavam, uma mensagem de um pai que ele nunca conheceu, ou o primeiro sinal de algo que o encontraria 13 anos depois. Mas, naquela noite de abril, aos 15 anos, no telhado do celeiro, ele soube: ele não era só de Smallville. E isso o assustava mais do que qualquer primavera podia curar.
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